Por muito tempo tive a ideia formada de que política, sobretudo a política institucional, partidária, das eleições e demais mecanismos sistemáticos, não funcionava. Que não funciona. Não era uma ideia de que "as coisas estão em más condições". Não. Era a ideia de que "as coisas não vão melhorar, por esses meios, porque o sistema é ruim e as pessoas também".
O sistema é ruim, decididamente. Vivemos uma política burocratizada, uma estrutura que engessa sua própria mobilidade, mas costumamos - ou eu costumo - expandir essa deficiência também para as pessoas, para as pessoas individuais que compõem as coletividades sobre as quais paira o sistema. Sabemos, é claro, que o sistema não "paira sobre", mas está misturado com, permeia todas as ações cotidianas e formas de pensamento mais simples. Entretanto, as pessoas apresentam uma vantagem frente a sistemas estruturados: as pessoas podem mudar com mais facilidade, podem acordar diferentes, podem ser tocadas por algo e passar a agir de outro modo. As pessoas mudam com maior rapidez do que as condições.
Por esse muito tempo, então, minha atitude frente a manifestações de apoio a algo era, no mínimo, cética. "Ninguém vai ler meu e-mail", "não vai adiantar", "ninguém se importa". Mas, agindo assim, eu estava sendo inconsistente com minha própria visão de mundo, com minha compreensão sobre a mudança.
Não sei se alguém vai ler meu e-mail, não sei se vai adiantar, não sei se alguém - além de mim, porque sobre mim eu posso ter certeza, caso preste atenção suficiente - não sei se alguém se importa, mas também não sei se não. Não posso afirmar que não. Isso, nunca.
Há uma passagem no Tenzo Kyôkun, as Instruções para o Cozinheiro-Chefe Zen de Mestre Dogen (fundador da ordem japonesa Soto Zen, confira aqui: http://aguasdacompaixao.files.wordpress.com/2008/01/dogen-eiheishingi-tenzokyokun-instrucoesparaocozinheirochefe.pdf) que diz:
"Se nós não podemos saber como nos fixar no Caminho, como podemos avaliar outra pessoa? Se os critérios a partir dos quais nós julgamos os outros são incorretos, podemos pensar que seus bons aspectos são maus e vice versa. Que grande engano!"
Se não sabemos como seremos amanhã, como podemos nos apressar a julgar os outros? Se o fizermos, seremos contrários a nossas próprias possibilidades de mudança. Como posso afirmar o que alguém fará hoje, se eu próprio não sei como eu serei amanhã - ou daqui a minutos?
De acordo com o Buda histórico, Siddharta Gautama, só há um meio para o praticante conhecer as coisas, saber de seus efeitos e de sua validade: praticando. O Buda sempre reforçou, em seus ensinamentos, um ponto fundamental e muitas vezes esquecido. Esse ponto diz que ninguém deve aceitar verdades sem, antes, investigá-las. Nenhum mestre espiritual, nenhum professor gabaritado, nenhuma autoridade superior, ninguém tem a possibilidade de nos mostrar a verdade, exceto nossa própria experiência.
Então, como pode ser verdade que "não vai adiantar nada", se eu ainda não agi? Se eu ainda não ofereci a oportunidade para que algo acontecesse? Se não adiantar nada, tudo bem. Se adiantar algo, minha experiência foi válida.
Nenhum mestre, professor ou autoridade tem superioridade sobre nossa experiência, sobre nossa atenção e ação. Ninguém, nem mesmo nós e nossos preconceitos, medos e incertezas.
O Buda dizia "venha e veja", convidando a experimentar suas descobertas. No mesmo sentido, a prática e o exercício na vida social, na vida pública, deve ser um "vá e faça". Esteja de acordo com o desejo de ajudar os outros, de fazer o bem. Considere cuidadosamente suas atitudes e os possíveis efeitos de suas ações. Mas, se existe uma possibilidade qualquer, vá lá e faça. É possível que os resultados surpreendam.
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