O imperador pensava nos duzentos corpos, mortos, crianças perdidas. Alguns já eram adultos, verdade, mas para as mães e pais daqueles mortos eles seriam crianças por toda a vida.
Vida dos pais e mães, que fique claro - pensava o imperador. Os duzentos mortos estavam mortos, e agora só deus, deuses, fantasmas e o mundo eterno das histórias é que lidariam com eles. Para os familiares, amigos, chegados, para as pessoas sensíveis o fato era que aqueles mortos mataram pedaços de muito, mas muito mais que duzentas vidas.
Sendo direto, pragmático, o pensar do imperador fazia contas: de duzentos, dois pais pra cada. Isso já dava quatrocentos. Era possível tirar alguns números, claro, porque com certeza alguns eram órfãos, completos ou de pai, ou de mãe. Mas multiplicavam-se também mais e mais mortos pela morte, porque os duzentos tinham avós, irmãos, irmãs, talvez filhos.
Os duzentos tinham amigos.
E é provável que, além disso, os sensíveis também contassem. Das duas centenas, mais outras centenas tiveram partes mortas, naquele dia.
E para os que morreram, pensava o imperador, a dor tinha sido clara, marcante e imediata, mas passara. Para os que só morreram pedaços, a dor que não doera voltaria, volta e meia, a doer pelas filas demoradas de banco, pelas noites de insônia e dos sonhos, ao lavar louça, roupa, ao trepar ou sorrir.
Milhares, concluiria o imperador, não sem pesar. Milhares de mortos no corpo de duzentos meninos lambidos pelo fogo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário